Daytripper, de Fábio Moon e Gabriel Bá



Por Aline Maria Anzolin

A imprevisibilidade da vida e todas as problemáticas que surgem ao longo dela têm espaço garantido na literatura desde seus primeiros registros. Daytripper é uma HQ que toma conta do tema das grandes questões existenciais, e garante seu traço dramático como elemento favorável a essa abordagem. Os irmãos quadrinistas paulistanos Fábio Moon e Gabriel Bá, vencedores dos prêmios Eagle e Eisner, também responsáveis  pela adaptação de Dois Irmãos para os quadrinhos, fizeram da história de Brás de Oliveira Domingos, uma das mais bem sucedidas HQs brasileiras mundo afora.




Daytripper não possui uma linha narrativa extremamente regrada, talvez fosse mais fácil descrevê-la como uma história dividida em crônicas, cada uma referente a um momento especifico da vida de Brás, a personagem principal, um escritor que ganha a vida com a morte alheia, no obituário de um jornal, e passa a ter sua morte (ou suas mortes) narradas em cada um desses episódios. Por isso, pode ser considerada como uma história que gira ao redor da vida, mas também de seu fim, e tudo que se encontra entre esses dois episódios tão complexos.


Das pequenas agradáveis surpresas que a HQ nos reserva, vale ressaltar a semelhança inegável de Brás a Chico Buarque, e a lembrança a Machado de Assis não só ao batizar a personagem principal com o mesmo nome que uma das personagens mais marcantes do autor, mas também na temática, onde conhecemos a história de um homem desde seu nascimento até o último de seus dias. Talvez, caiba ao momento ambientado à HQ mostrar uma mesma angústia por um viés pós-moderno, e ai é que se encaixe uma diferença primordial, mas também onde é possível notar que algumas de nossas incertezas não mudam tanto assim.


Seja em seu primeiro beijo aos 11 anos, o nascimento de seu filho, um amor que parecia durar para toda a vida ou um café com seu melhor amigo, fica difícil distinguir o plano em que a história se passa (real ou ilusório), e em cada um desses pequenos momentos, que muitos de nós classificaríamos como irrelevantes, Moon e Bá, retratam um ambiente de possibilidades, escolhas, quase uma demonstração do efeito borboleta da vida, ou das muitas vidas fragmentadas, que Brás poderia ter tido ao longo de uma única experiência. Os irmãos nos colocam diante de todas as possíveis mortes desse escritor, para cada morte uma vida e talvez para cada vida, um homem. 


Nas páginas finais da edição publicada pela Panini, Fábio Moon apresenta os primeiros esboços que dariam vida a história e comenta “Daytripper seria uma história de momentos silenciosos. Sobre o que você pode dizer a partir dos olhos de alguém. Uma troca de olhares. Um sorriso.” [...] “Queríamos a sensação de que a vida está acontecendo aqui, bem à nossa frente, e a estamos vivendo. E como vivemos. E às vezes morremos para provar que vivemos.”

Mais que páginas com uma história colorida, Daytripper é a demonstração de uma vida que aconteceu, acontecerá ou poderia ter acontecido, e coloca-se como uma representação do humano e seus sentimentos, o amor, as angústias, laços familiares, as amizades, crescer e evoluir, crescer e se ver no mesmo lugar, sonhos e paixões sob a incógnita da morte.

“É apenas quando você aceita que vai morrer que consegue realmente se libertar e aproveitar a vida ao máximo.”

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